segunda-feira, 19 de julho de 2010

Eu me sinto um estrangeiro II

A Cachoeira Alta do Tarumã, localizada em Área de Preservação Ambiental, na cidade de Manaus, pertencente ao recém-criado Corredor Ecológico das Cachoeiras Alta e Baixa do Tarumã – , está sendo vítima de uma intervenção “urbanística” que no mínimo vai descaracterizá-la como Patrimônio histórico-natural, ecológico e paisagístico de nossa cidade.

O Prosamim é uma intervenção urbana de grande impacto. Retirou milhares de famílias de uma situação de moradia inadequada que poluía os igarapés, provocava perda de vidas humanas e enfeiava a cidade. O risco de doenças infecto-contagiosas também era alto em todas as áreas atingidas pelo Prosamim.  Sob o ponto de vista sanitário e paisagístico o quadro melhorou, mas deixa a desejar no quesito ambiental, porque optou pelo concreto e a grama, para susbtituir a floresta nas margens dos igarapés canalizados. 

Os moradores foram reinstalados em áreas próximas ao antigo igarapé, onde residiam. As obras canalizaram cursos dágua e urbanizaram as margens com concreto e ferro. Agumas palmeiras e plantas ornamentais completaram a cena. Nossa cidade vai ter que pagar a dívida gerada pela obra de alto custo. O que incomoda é a possibilidade de perdermos o dinheiro do investimento e os benefícios conquistados. Tudo isso pode ser carregado pela enxurrada rápida e incontrolável, de tempestades.

Igarapés- sejam eles urbanos e poluídos ou balneários rurais limpos e conservados -,precisam de muitas árvores ao longo de suas margens, para conter a velocidade das enxorradas e a lavagem do solo que causa assoreamentos, provocados pelas chuvas típicas de nossa região. Grama não segura nem chuva forte, quanto mais enxorrada. Concreto, vira parede, que a força da correnteza arrasta com facilidade.

Essa cena acontece em todos os igarapés da cidade. Nos balneários rurais como o Igarapé Água Branca, - deságua na Cachoeira Alta Alta do Tarumã – uma chuva forte aumenta a correnteza e eleva aos poucos o nível da água. Se a chuva for ininterrupta por pelo menos 3 horas, quando a tempestade acabar o igarapé Água Branca estará supercheio, com água barrenta e fortíssima corenteza que carrega paus, galhos de árvores, troncos, palha de buriti, barro e areia.

O mesmo cenário não será repetido nos locais urbanizados. Ali o concreto e a grama substitituíram as florestas e o igarapé canalizado aumenta rapidamente seu nível, gerando uma correnteza livre de obstáculos que alcança velocidade de vazão muito superior a que registramos aqui no Água Branca, por exemplo. Essa combinação de Cheia quase instantânea e velocidade da correnteza, já destruiu cidades, como vimos recentemente no noticiário nacional.

Lá no bairro do Coroado o canal foi urbanizado na década de 90. Ele foi canalizado, recebeu alambrados, casas foram afastadas do leito e hoje, duas décadas depois o canal está cheio de árvores e o local fora dos noticiários que relacionam tragédias com chuvas fortes em #Manaus. Estas intervenções em igarapés praticamente destruídos e desfigurados pela ocupação urbana não começaram agora e no caso do Coroado, 20 anos depois as margens do canal estão cheias de árvores e o igarapé embora canalizado tem aspecto mais natural.

Urbanizar o Igarapé da Cachoeira Alta é um erro! Uma atitude truculenta, planejada e executada sob a obscuridade das decisões tomadas em gabinetes autoritários. Nós do blogaguabrancaonline não entendemos como o Poder Público realiza intervenções dessa magnitude sem consultar moradores e talvez até à revelia das Leis Ambientais.

Maquiar o igarapé apenas nas proximidades do leito da Cachoeira Alta do Tarumã, representa a desfiguração da paisagem e do ecossitema frágil que envolve as áreas de preservação em todas as Cachoeiras catalogadas no Brasil. A obra, portanto, pode ser considerada ilegal sob a luz de legislação Federal, Estadual e Muncipal.

Obras precisam ser realizadas no Igarapé da Cachoeira Alta, mas têm que ser completas, com retirada de casas, das fontes de poluição e assoreamento, priorizando o replantio de árvores nativas e despoluição de todo o igarapé, desde a nascente, até a foz. O Governo poderia construir apartamentos em outros locais no mesmo bairro e doar aos que saíram do igarapé.

Um Prosamim diferente, voltado para balneários urbanos ainda conservados nas últimas áreas de florestas remanascentes no entorno de #Manaus. Nós temos certeza que os moradores do Tarumã residentes nas margens e até dentro de igarapés iriam gostar de zelar pela qualidade ambiental de um novo bairro. Planejado e com o prévilégio de abrigar um igarapé conservado e revitalizado abastecendo a bela #Cachoeira Alta do #Tarumã.

Tudo isso só é possível com reflorestamento em toda extensão do Igarapé, reintroduzindo espécies nativas. Essa obra é possível, mais barata, definitiva, sustentável e nós a queremos. A Cachoeira precisa dela para continuar existindo. Igarapés canalizados transportam água em alta velocidade. O nível do igarapé aumenta muito e rápido. Esse enorme volume de água gerado, pode causar danos estruturais imprevisíveis em toda a base da Cachoeira Alta. Nos últimos 20 anos ela já perdeu quase 80% do volume de água original, basta comparar os registros fotográficos antigos ou simplesmente medir o tamanho da lage de queda dágua, comparado ao tamanho do filete de água vertente atual.

A Cachoeira Alta, do mais novo #Corredor Ecológico Municipal e todo seu entorno, com área superior a 10 quilômetros quadrados está sob ameaça de urbanização. A Vocação de Corredores Ecológicos no mundo inteiro, passa pela conservação e revitalização dos recursos naturais presentes nas áreas de implantação. Revitallizar essas Áreas de Preservação, significa apenas replantar, limpar, despoluir, desocupar e formar parcerias comunitárias para ajudar a manter, zelar e administrar o modelo.

Mas eu sei que isso não vai acontecer aqui em #Manaus. Vamos ser cidade sede de #Copa com igarapés canalizados, gramados e pracinhas substituindo florestas, até mesmo em balneários como a Cachoeira Alta e o Igarapé Água Branca. Nessa estória, minha cidade me trata como se eu fosse um estrangeiro, passageiro de outro trem. Um trem que não passa por aqui. Se voce não concorda, não importa, tudo já está sendo realizado. Sendo voce um estrangeiro, a obra não é tua e nem prá ti, pertence aos donos da cidade.

Jó Fernandes Farah – Pres. Ong Mata Viva, gestora do blog aguabrancaonline.blogspot.com. 

Um comentário:

Anônimo disse...

Muito sensato o artigo. Comprometido com a qualidade de vida em Manaus. Onde está a Justiça, Varas Ambientais, Ibama, Semmas, Ipaam? Falta seriedade e compromisso com a sociedade, com o cidadão eleitor. Vamos colocar prá fora os inoperantes. Vote certo, procure saber se seus candidatos têm propostas voltadas para o meio-ambiente e desenvolvimento sustentável.
Horácio Vila